Meu Bisavô e o Sobrenatural

 

Meu bisavô, pai da minha avó, ele era um homem bastante diferente. Ele foi tropeiro por muitos anos, até se aposentar. Foi quando eu conheci ele, criança ainda.

Mas, além de eu ser apegado com ele, ele me chamava atenção. Até hoje eu lembro. Ele, nessas suas andanças como tropeiro, ele aprendeu algumas coisas com pessoas um tanto diferentes.

Rezas, conhecimento de coisas que não eram naturais, ditas sobrenaturais. Algumas coisas eu lembro que eram muito comentadas na família. Uma delas é que, quando as casas, naquela época, o terreno, o pátio, era infestado por bichos peçonhentos, como eles diziam, chamavam ele, ele ia lá, fazia reza, e então se via os bichos simplesmente, aranha, escorpião, cobra, esses bichos, enfim, saiam andando de dentro do pátio.

Aí ele, antes disso, já avisavam os donos do terreno, para já terem comprado uma corda do tamanho do perímetro do terreno, que ele faziam uma reza e preparava a corda de alguma forma que não faço a miníma ideia. E daí faziam uma espécie de canaleta em volta do terreno e botavam aquela corda enterrada nessa canaleta em toda a volta do terreno. Pois assim os bichos peçonhentos não voltavam mais, porque senão depois de um tempo eles poderiam querer voltar.

Aquela corda enterrada naquela canaleta em volta do terreno impedia isso, e funcionava. Isso era muito impressionante. Outra coisa que me chamou muito a atenção, que eles contavam muito, é que uma vez tinha, lá de onde eu vim, no interior, tinha os granjeiros que tinham plantação de soja, terras que não parava mais.

E o dono de uma daquelas terras tinha uma parte da terra que não era plantada, mas seguidamente entrava gente por ali, para roubar coisas. Então ele teve a ideia de botar uma família morando naquela parte das terras. O dono separou um terreno lá, construiu uma casa de madeira e contratou um pai de família para vir morar com a sua família ali.

Ele ia ganhar o salário, a casa para morarem, e uma parte do terreno que o dono falou que ele podia plantar o que quisesse ali, e o que viesse dali era dele e de sua família. O homem prontamente gostou da proposta e aceitou. Ele só tinha que ficar morando ali, e se visse algum movimento, principalmente à noite, o dono daquelas terras lhe deixaria uma espingarda, era só ele atirar para cima, que o barulho provavelmente iria espantar os invasores, e eles escutariam, e ele mandaria os funcionários, os homens que moravam no alojamento, vir lá ver o que era.

Ele prontamente aceitou. Só que o homem, o dono das terras, não avisou que quando os funcionários dele estavam passando o arado nas terras à noite, eles viam bolas de luz caindo justamente naquele território onde ele tinha construído a casa para aquela família, e bolas de fogo flutuando sobre a lavoura e entre a floresta sem queimar nada. Ele não tocou nesse assunto.

Cerca de uma semana depois, o pai da família que estava morando naquelas terras foi falar com o dono, dizer que sentia muito, mas ele não ia poder ficar mais lá. O homem perguntou por quê, e ele disse, estou gostando do trabalho, mas está insuportável. Ele disse, no primeiro dia, a gente via bolas de luz caindo aqui no terreno que o senhor construiu a casa para a gente.

Depois vimos bolas de fogo flutuando por entre a lavoura e por entre as árvores do mato, sem pegar fogo. Mas como eu já havia visto isso, minha mulher também, em outros lugares que moramos, logo que escurecia, a gente se recolhia para dentro de casa e procurava não pensar nisso. Em poucos dias, começamos a escutar pedradas na casa, no telhado, na porta, nas janelas, nas paredes.

Eu saia armado para ver se alguém estava atirando pedra. Não tinha nada, nem pedras, inclusive. Simplesmente não havia nada, nem pegadas, nem pedra, nada.

Depois começaram a bater nas portas, a gente saia para ver o que era, não tinha ninguém. E chegou um ponto que começamos a ver coisas se movimentar e cair dentro de casa. Aí, a gente achou demais.

Por isso, que não queremos mais. Daí o dono das terras disse, não, espera. Fica aqui, pegue a tua família, fica em um dos alojamentos aqui, dos empregados, que eu vou chamar alguém que costuma resolver isso.

Foi quando chamaram o meu bisavô. O nome do meu bisavô era Ataliba, ele era conhecido pelo apelido de Seu Taboca. Daí chamaram, disse, eu vou chamar o Seu Taboca para resolver isso.

E meu bisavô foi lá, naquelas terras que não parava mais, naquela parte mais isolada, naquela casa. Meu avô olhou e disse, eu tenho que passar a noite aqui sozinho para eu entender o que está acontecendo. E assim foi feito.

Ele passou a noite sozinho lá, todos ficaram espantados, porque sabiam a fama daquele lugar. Durante a noite, eles viram aquelas bolas de luz caindo lá e aquelas chamas flutuantes circulando por lá.

De manhã, chegaram para ver o que tinha acontecido e estava o meu bisavô sentado na varanda, tomando chimarrão. O dono das terras foi perguntar o que ele poderia dizer sobre aquilo. Ele falou, olha, foi me dito, ele nunca contou quem foi que disse isso para ele.

E ele pontou com o dedo, aqui, ali, lá, tem janelas, que é para outro mundo. Daí vem coisas, espíritos, do outro lado, para cá, e depois eles voltam por essas janelas. O senhor colocou essa casa para essa família bem no caminho.

Eles me disseram que a casa está no caminho, é por isso que está acontecendo tudo isso. Daí o meu bisavô disse, e eles disseram, o que vai ser é desmanchar essa casa e colocá-la logo ali, a uns metros mais adiante, sair do caminho deles e a perturbação vai parar. Só não vai parar com as bolas de luz e o fogo flutuando por aqui.

Assim foi feito. O dono das terras desmanchou a casa e construiu mais adiante, como tinha sido instruído pelo meu bisavô. Realmente, a família morou por muitos anos lá.

Eles viam as bolas de luz caindo naquela parte da terra e as bolas de fogo circulando pela floresta, mas eles não foram mais perturbados. Essa história era muito contada na família. Principalmente minha mãe me contava muito.

Eu achei muito impressionante. E meu bisavô,  quando partiu desse mundo, ele tinha cerca de uns 90 anos, isso também me impressionou muito. Era uma noite de madrugada, estavam todos dormindo, quando minha avó se acordou com os gritos e a fala do meu bisavô.

Ela se levantou, foi na porta, acendeu a luz e perguntou, pai, o que é isso? Por que o senhor está gritando e falando assim sozinho? Ele disse, a finada, estava aqui na porta, não viu? A finada era a esposa dele, que já havia falecido há alguns anos. Ele disse, ela veio aqui e eu perguntei o que ela queria, porque ela tinha vindo e o que ela queria.  Ela não disse nada, chegou perto da minha cama, e ele estava se limpando, a roupa e a cama, e me jogou um punhado de terra.

Aqui está tudo sujo de terra. A vó disse, mas eu não estou vendo nada. Mas como está aqui, olha a cama suja de terra, olha a minha roupa aqui.

Ele abriu a mão e tentou afastar a terra que só ele enxergava. Daí a vó fez que estava ajudando ele a limpar, e disse, agora dorme, descansa. Ele dormiu.

Poucos dias depois, ele faleceu, partiu desse mundo. Ou seja, a finada, como ele chamava, a esposa dele, que já tinha morrido há muitos anos, tinha vindo comunicar a ele que a hora dele tinha chegado, dele ir embora desse mundo tão estranho e bizarro.

Meu bisavô era um homem impressionante, levava uma vida bizarra, acho que é de família mesmo.

 

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